Lembranças
na Semana do Reservista
Wanderlino
Arruda
“Aprendemos para a vida”, “não só
para a escola, mas para a vida”, frases didáticas
do velho Colégio Diocesano, nas aulas de latim do Monsenhor
Gustavo, que muito têm servido ao longo da existência.
Realmente, nunca estudei só para a escola, só
com aquele objetivo imediato de ganhar boas notas, embora
uma boa nota faça sempre, mesmo em um adulto, uma alegria
criança, elogiada e mimada, situação
importante em qualquer época da vida. Falo sobre escola
e sobre resultados, sobre alegria íntima ou exterior,
para lembrar de inesquecíveis tempos do meu Tiro de
Guerra, espaço de civismo do meu grande mestre Sargento
Moura. Turma de quase cem rapazes, todos da mesma idade, todos
com o mesmo sonho, povoamos por vários meses a poeirenta
praça da Estação, num terreiro público
onde a velha Rodoviária incomodava o formigueiro humano
que entrava e saia de Montes Claros.
O prédio de Tiro de Guerra, localização
privilegiada numa esquina da Rua Tiradentes com a Praça
e a Rua Melo Viana, tinha grande espaço de manobras
até a estátua de Francisco Sá, no meio
de pequeno jardim, no início das outras avenidas. Casa
enorme, com salas e salões, tinha nos fundos a moradia
do Sargento Moura e um quintal onde um por um havia de montar
guarda, dividindo a segurança com o atirador, que ficava
na porta de entrada. Não havia cadeiras, havia bancos,
duros e pesadões, separados com razoável distância
para evitar cotoveladas e outros tipos de brincadeiras tão
normais entre a rapaziada. De todos os lados, menos à
direita, janelas e mais janelas, que existem até hoje
no atual supermercado, que veio alguns anos depois, quando
o TG saiu para a Vila Ipê e mudou de instrutor.
O Sargento Moura, altão, moreno, elegante, imponente,
falador, era o dono incontestável do tempo e da turma,
primeira e última palavra em qualquer situação,
só humilde nas eventuais inspeções ou
no exame final do mês de outubro, quando vinha o Capitão,
uma espécie de imperador ou professor-chefe, que passava
a centralizar todo o nosso interesse e cuidado. O Sargento
Moura só era muito sério nas horas de instrução,
e exigente, nas ordens de comando. Nas outras partes do dia,
quando íamos ao Tiro para qualquer assunto, ou quando
nos encontrava na rua ou em nosso local de trabalho, era como
se fosse um colega mais velho, bondoso, amável, sempre
um grande amigo, brincalhão, a colocar a mão
no ombro de cada um em tom de conselheiro. Como bom professor,
sabia de tudo, todos os assuntos eram do seu domínio,
pertenciam ao seu mundo de cultura e de experiência
humana.
Dos companheiros de caserna, se podemos chamar de caserna
um local que nos segurava apenas em parte de cada manhã
e em algumas horas a mais no domingos, dos companheiros, temos
muito que lembrar. Afinal, havia gente de todo jeito para
povoar toda uma vida de lembranças, principalmente
os mais extrovertidos que deixam marcas pela quase eternidade.
Isso para não dizer das influências e notícias
de turmas passadas e futuras, que queira ou não, surgem
e ressurgem da saudade. No meu tempo, os mais compenetrados
eram os dois Renatos, o Veloso e o Almeida, por sinal, os
mais capazes, do RDE aos exercícios de marcha e de
tiro. Os mais malandros eram o Pamplona e o Souto terríveis,
imprevisíveis, tanto para nós como para o Sargento.
O Souto é hoje bem conhecido, gostando mais de ser
chamado de Humberto, sem o Guimarães, depois que foi
eleito deputado. Havia os caladões, os resistentes,
os corajosos, uns que queriam aparecer, e alguns poucos bem
desligados. A maioria, com o máximo de interesse, vibrantes.
Bons tempos, com tantas lembranças, que acho terei
de voltar ao assunto em outra oportunidade. De alguma forma,
fico muito grato a esta “Semana do Reservista”,
que evocou importante momento de minha vida e, creio, muito
saudável à memória dos que passaram pelos
inesquecíveis momentos de vida militar no velho Tiro
de Guerra 87, do Sargento Moura e dos seus sucessores.
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